Ceramistas Terena recebem equipe para inventário dos modos de fazer cerâmica tradicional

por | dez 17, 2025 | Notícias

A mobilização do povo Terena para iniciar o Inventário Nacional de Referências Culturais (INRC) dos modos de fazer cerâmica marca o começo do mapeamento de um dos saberes mais identitários de sua cultura.

As ações iniciais do INRC dos modos de fazer cerâmica Terena ganharam força no fim de novembro, quando o Centro de Trabalho Indigenista (CTI), em parceria com o Conselho do Povo Terena, realizou uma série de reuniões na Terra Indígena Cachoeirinha, em Miranda (MS), e na Feira Central de Campo Grande. Mais que uma etapa técnica, a mobilização aproximou famílias, lideranças, anciãos e mestras ceramistas em um processo de escuta e construção conjunta, reafirmando o valor deste conhecimento ancestral para a memória e a continuidade cultural do povo.

Ao longo de dois dias, a equipe do CTI buscou cada família detentora do saber, os núcleos das ceramistas Dilma, Arlene, Dina e Rosenir para dialogar sobre o inventário, explicar suas etapas e ouvir histórias, trajetórias e preocupações. As conversas ocorreram nos quintais, espaços de criação e convivência, sempre no ritmo da comunidade. Cada encontro trouxe à tona memórias pessoais, vínculos com o território e as camadas espirituais que compõem o fazer cerâmico Terena.

Escuta como fundamento

A apresentação do projeto, que inclui pesquisa de campo, entrevistas, oficinas, mapeamento de pontos de coleta de argila e registro audiovisual, foi recebida com atenção e participação ativa das ceramistas. A proposta de formar uma equipe indígena de pesquisa e comunicação foi decidida de maneira colaborativa, respeitando o lugar que cada família ocupa no saber tradicional. A presença do ancião Élcio, compartilhando perspectivas históricas, reforçou a profundidade simbólica do processo.

Ao identificar as famílias que mantêm a prática, o inventário também se firma como um espaço de encontro e fortalecimento da noção de patrimônio como bem coletivo. O diálogo aberto com cada grupo permitiu construir um cronograma realista, sensível ao tempo do barro, às rotinas das mulheres e à dinâmica comunitária.

Território, juventude e transmissão

Um dos pilares do projeto será o mapeamento dos locais de coleta da argila, atividade que envolverá estudantes Terena, agentes ambientais e ceramistas. As expedições previstas não apenas localizarão os pontos de matéria-prima, mas também aproximarão os jovens da pesquisa, do pensamento sobre patrimônio imaterial e da responsabilidade com o território que sustenta o saber.

A criação de um núcleo indígena de pesquisadores e comunicadores, entre eles filhos, filhas e netos das próprias ceramistas, reforça a importância da transmissão intergeracional. O inventário prevê ainda oficinas de cerâmica e de educação patrimonial, além da produção de um minidocumentário e duas exposições públicas, na aldeia e em Campo Grande, ampliando o reconhecimento deste bem cultural.

Um patrimônio que pulsa

Para o povo Terena, a cerâmica é mais que uma técnica: é uma forma de narrar a vida, honrar as ancestrais e dialogar com o território. Cada peça moldada guarda histórias, afetos, práticas espirituais e marcas de resistência. Ao iniciar o INRC, CTI, Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN) e comunidade reforçam juntos que este saber não pertence apenas ao passado; ele segue vivo e em constante recriação pelas mãos das mulheres que o sustentam.

Assim, o inventário além de registrar modos de fazer, reafirma um vínculo profundo entre cultura, memória e identidade, garantindo que a cerâmica terena continue presente na vida das próximas gerações como símbolo de força, continuidade e pertencimento.